Intercâmbio de experiências em agricultura familiar reúne mais de 100 participantes de 17 países

As apresentações abordaram experiências bem-sucedidas no Brasil, El Salvador, Guatemala e Peru.

Paulo Beraldo

Brasília, Brasil, 26 de março de 2024 – Mais de 100 profissionais ligados aos programas de alimentação escolar (PAE) de 17 países da América Latina e do Caribe participaram, no dia 21 de março, de um intercâmbio de experiências sobre mecanismos para fortalecer as compras públicas na alimentação escolar.

O evento virtual foi promovido pela Representação da FAO em El Salvador e pela Coalizão Alimentar, com o apoio da Rede de Alimentação Escolar Sustentável (RAES). A RAES é uma estratégia impulsionada pela Agência Brasileira de Cooperação do Ministério das Relações Exteriores (ABC/MRE) e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação do Ministério da Educação (FNDE/MEC) do Brasil, com o apoio da FAO, por meio do projeto Agenda Regional de Alimentação Escolar Sustentável na América Latina e no Caribe, executado no marco do Programa de Cooperação Internacional Brasil-FAO.

Vincenzo Cursio, coordenador da Coalizão Alimentar, comentou que essa organização está trabalhando para promover colaborações entre diversas partes interessadas, buscando agir em propostas que enfrentarão desafios concretos no campo, como é o caso dos programas de alimentação escolar.

Em 2021, Colômbia, Equador e El Salvador, através das representações da FAO e em conjunto com os governos nacionais, manifestaram interesse em desenvolver o projeto “Fortalecimento dos programas de alimentação escolar durante e após a pandemia de COVID-19”, que une esforços para o fortalecimento dos PAE, através da metodologia de Escolas Sustentáveis, para contribuir para a garantia do direito humano à alimentação adequada (DHAA). Os três países contam com o apoio da Coalizão Alimentar na implementação dessa metodologia, que foi desenvolvida pela Cooperação Internacional Brasil-FAO em 2012 e já está presente em 14 países.

Plinio Pereira, em nome da ABC/MRE, comentou que a RAES é um instrumento inovador regional para fortalecer capacidades institucionais e humanas para permitir a continuidade de um esforço conjunto e solidário em direção a mudanças e avanços na direção do DHAA.  Ele mencionou que 26 países participam das atividades da RAES, como seminários, eventos e intercâmbios para troca de conhecimentos. Por fim, acrescentou que a presidência do Brasil no G20 em 2024 abre oportunidades de cooperação, já que o país está propondo a criação de uma aliança global para combater a fome e a pobreza.

O papel das Escolas Sustentáveis

Carolina Mejía, diretora de programas sociais do Ministério da Educação, Ciência e Tecnologia de El Salvador, valorizou o apoio da cooperação internacional e acrescentou que a experiência das Escolas Sustentáveis “tem sido uma referência na implementação dos PAE sustentáveis, especialmente através da articulação interinstitucional, do envolvimento da comunidade escolar, da adoção de menus saudáveis, da implementação de hortas escolares, da construção de cozinhas, refeitórios e armazéns, além das compras públicas diretas para a alimentação escolar”. Também comentou que o fortalecimento das capacidades institucionais e a elaboração de marcos legais para implementar a AE foram decisivos no país. “Isso tem demonstrado que é necessário um esforço coletivo e institucional para alcançar os objetivos dos PAE”.

Mudança climática, compras públicas e alimentação escolar

Por sua vez, Israel Ríos, oficial de nutrição da FAO, fez uma apresentação sobre a relação entre as mudanças climáticas e a alimentação escolar. Israel comentou que para enfrentar os desafios das mudanças climáticas, que prejudicam as produções, elevam o custo de produção e consumo de alimentos, são necessárias políticas abrangentes e multissetoriais, como a alimentação escolar. Ele mencionou que é muito importante coletar dados e envolver nos diálogos os tomadores de decisões de políticas públicas, acadêmicos, parlamentares e outros gestores de alto nível.

Najla Veloso, coordenadora do projeto regional de alimentação escolar da Cooperação Brasil-FAO, explicou que a mudança climática leva à perda dos meios de vida das famílias devido à diminuição da produtividade agrícola e à deterioração dos recursos naturais, como solos, água doce e biodiversidade local. Nesse sentido, afirmou que as compras públicas são uma alternativa viável porque garantem: i) planejamento da produção agrícola; ii) renda para pequenos agricultores; iii) melhor qualidade e quantidade de produtos; iv) adoção de produção diversificada; v) promoção do uso de biofertilizantes e controle de pragas; vi) alternância de produtos e melhor uso do solo; vii) redução de perdas e desperdício.

Como obstáculos para a implementação de compras públicas, destacou: i) a ausência de diretrizes legais; ii) necessidade de gestão e planejamento do processo de circuitos curtos de comercialização; iii) falta de mapeamento da produção; iv) falta de vias de acesso; v) informalidade nos processos organizativos; vi) dificuldades de conectividade; vii) barreiras logísticas; viii) lacunas nos canais de informação e acesso à internet.

Experiências dos países

Luis Enrique Alonso, da Direção Geral de Participação Comunitária e Serviços de Apoio do Ministério da Educação da Guatemala, detalhou a experiência de compras públicas do país, observando que a Lei de Alimentação Escolar é uma das fortalezas do país. O arcabouço normativo guatemalteco determina que 70% dos produtos devem proceder da agricultura familiar local. Alonso citou também o papel das organizações de pais – associações comunitárias legalmente constituídas com personalidade jurídica – para a execução mais simplificada das compras públicas. Como desafios, mencionou a melhoria da infraestrutura para a preparação de alimentos e a presença de mais agricultores oferecendo produtos ao PAE.

Ana Carolina Silva, da divisão de agricultura familiar do PNAE do Brasil, que é executado pelo FNDE, apresentou 10 passos para as compras de produtos da agricultura familiar: i) verificação orçamentária; ii) articulação com atores sociais; iii) definição do cardápio escolar; iv) definição de preços de compras; v) aviso de chamada  pública; vi) preparação do projeto de venda; vii) recebimento e seleção de projetos de venda; viii) apresentação de amostras de produtos; iv) contrato; v) documento de recebimento e pagamento.

Por sua vez, Carolina Ramírez González, da Representação da FAO no Peru, comentou sobre os avanços do PAE no país, como o piloto de Escolas Sustentáveis na região de Junín com compras públicas através de comitês de alimentação escolar. Ela acrescentou que foram desenvolvidos estágios para profissionais de governos locais como Tumbes, Piura, Lima, Arequipa, Huancavelica e Maycas nesse território com o objetivo de escalar a metodologia. Também afirmou que a lei de compras estatais de alimentos de origem na agricultura familiar, de 2020, foi um avanço importante.

Reina Maria Osorio, da Representação da FAO em El Salvador, para concluir, comentou que atualmente existem múltiplos desafios que aumentam o custo dos alimentos e afetam a nutrição e os meios de subsistência das populações. Ela acrescentou que a alimentação escolar pode ser uma política bem-sucedida para enfrentar esses desafios e promover a transformação dos sistemas agroalimentares.